quinta-feira, 29 de maio de 2008

Banho escocês


Costumo pensar no amor como uma coisa séria, definindo-o como um sentimento profundo que prende duas pessoas uma à outra, reflectindo-se numa relação de cumplicidade e na construção de um projecto comum, venha ele a ser longo ou mais breve do que se pensava… mas esta coisa da duração do amor ou da sua finitude já é outra discussão.

Por isso entre o amor e o continente em que vivo há um mar imenso de desconfiança e de indisponibilidade. Já o desejo… esse mora ao lado. Existe ou não existe, ponto final. Se dura ou não dura? Quero lá saber. Bastam-me dois segundos dos teus olhos quando chego. O resto do meu dia e da minha vida não depende disso.

Por isso se torna impaciente, intolerante, egoísta, amuado, vingativo, teimoso... só virtudes! que aguento apenas dois segundos, o tempo em que pousas os olhos quando eu entro.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Quinque sensuum figurae




Tenho os sentidos escondidos, à espera, como lobos que vigiam o rebanho.

À espera que o tempo aqueça.
Que as tílias fiquem em flor.
Que a tua boca murmure o meu nome.
Que mais nada exista no teu pensamento senão eu.

Tão escondidos. Não darás por eles.
Procura.


Théâtre d'Amour
, fol. 109.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Sonata em Fá menor

Rembrandt, As Três Árvores, 1643

Procura cada qual, por seu próprio caminho, a graça, seja ela o que for, uma simples paisagem com algum céu por cima, uma hora do dia ou da noite, duas árvores, três se forem as de Rembrandt, um murmúrio, sem sabermos se com isto se fecha o caminho ou finalmente se abre, e para onde, para outra paisagem, ou hora, ou árvore, ou murmúrio (...).


Porque sinto o coração mais apertado quando penso nas mãos exactas e tranquilas de Domenico Scarlatti?


Memorial do Convento
, XV.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Revisitação

A leitura contínua e repetida do Memorial do Convento a que me tenho submetido no último mês tem-me feito pensar muito.

Estou a ver D. João V esparramado na alcatifa a montar as peças da basílica de S. Pedro com ideias a nascerem-lhe em catadupa. Por acaso conheço o processo. Eu própria gosto de puzzles e tenho sempre um bloco de apontamentos ao lado para registar as melhores. Adiante. Estou então a ver D. João V a pôr peças em cima de peças, ou mandar os criados fazê-lo, se também mandou meio reino para Mafra... ou, mais tarde, a ver os filhotes de D. Maria Ana Josefa, com cara de percevejo, os filhos, não a rainha, coitada, que praticamente pariu também um mosteiro, a entreteter a corte empoada, dourada e pintada de carmesim.
Era um rei fadado para ser arquitecto, o nosso D. João V. Se não fosse Ludovice teríamos outra basílica de S. Pedro em Mafra, uma maravilha de fazer inveja ao Papa. Aquilo é que foi fazer frades, que de treze para trezentos é muita vocação mendicante arregimentada. Era um rei com sentido de estado. Era um rei que era o estado, ponto final. Para onde iam o ouro, as pedras preciosas, os diamantes, de Cerro Frio, da Bahia, de Minas? A culpa foi de quem não perguntou. Pelo menos não se fala nisso. Fala-se em autos de fé, mas não de perguntas incómodas ao rei que tinha o rei na barriga.
D. João V, aos vinte e dois anos, brincava com legos, e prometia conventos para ter filhos, para não morrer de doença, porque lhe apetecia.

Por favor, há sempre uma razão para tudo; revistem a casa do Sr. Engenheiro José Sócrates. Pode ser que encontrem um compartimento com pistas de carros e carris de comboio, com pontes e túneis, árvores, rios, ovelhas, casas, com todas aquelas coisas com que os meus sobrinhos gostam de brincar.

Monsieur Hulot





Os meninos gostam de Jacques Tati: Jour de Fête (1949), Mon Oncle (1958) e, este domingo, antes do jogo da taça, Les vacances de Monsieur Hulot (1953). Reconhecem rapidamente o protagonista, Monsieur Hulot, com os seus enormes pés de fora, de desencontrada andadura.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Bartolomeu Lourenço de Gusmão & Domenico Scarlatti



Como se mostram variadas as mãos do homem, são de som as minhas, Fala das mãos, Falo das obras, tão cedo nascem logo morrem, Fala das obras, Falo das mãos, que seria delas se lhes faltasse a memória e o papel em que as escrevo, Fala das mãos, falo das obras.
nada digo,

Parece apenas um gracioso jogo de palavras, um brincar com os sentidos que elas têm, como nesta época se usa, sem que extremamente importe o entendimento ou propositadamente o escurecendo.
nada comento, sorrio.


Memorial do Convento, XIV.

sábado, 17 de maio de 2008

Blood Simple




Há filmes surpreendentes.

Há filmes que me deixam absolutamente desesperada, com vontade de entrar cena adentro e dizer ao protagonista que está a fazer tudo errado.

Blood Simple (EUA, 1985), realizado por Joel e Ethan Coen, faz-me ligar imensas pontas soltas.
Em primeiro lugar pensei logo no João e em tudo o que temos falado sobre o filme neo-noir. Sou boa ouvinte. Depois, o meu cérebro deu voltas à procura de Frances MacDormand e com alguma rapidez chegou a Fargo e a Marge Gunderson. Os Coen deixam marcas.
Depois parei em John Getz, bela figura de homem, e só hoje percebi porque não o reconhecia... caramba, já passaram mais de 20 anos. É curioso que a passagem do tempo não seja tão visível em MacDormand. Ou até é.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Cinco sentidos II



Ainda não descobri a forma de substituir o tempo ou apagar a memória. Mas já me fizeram "sentir" que não é preciso. Os sentidos não têm lugar, nem tempo, nem pessoa; são apenas flexionados em grau: sentir, sentir bastante, muito, demasiado, êxtase, transfiguração.

Há lições que dão gosto.


Alegoria dos cinco sentidos, Lairesse, 1668.

Cinco sentidos I



De ti já só tenho memória.
Memória do tempo em que todo te sentia.


Alegoria dos cinco sentidos
, Stosskopf, 1633.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Chuva



Chuva furiosa.
Tão furiosa que me apetece uma caneca de chá e uma lareira acesa. E um beijo, dois beijos... da mi basia mille, deinde centum, dein mille altera, dein secunda centum, deinde usque altera mille, deinde centum, dein, cum multa milia fecerimus, conturbabimus illa, ne sciamus aut ne quis malus invidere possit (Cat. car. 5).


Até três de Junho do ano passado havia um blogue todinho em latim... e demorei dois segundos a encontrar o poema... às vezes o google assusta-me.


Ok, fui ver melhor o tal magno clamore... só teve três entradas. Percebe-se. Eu própria também ficaria derreada com o esforço. :)

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Crónicas do Mosteiro III




São 8.30 da manhã em S. Cristóvão. O Pedro chegou do Porto só hoje de manhã e sentou-se ao meu lado para tomar um café antes de começarmos os trabalhos. Comentámos a excelente recuperação do espaço, um mosteiro de Cister.

Há casas com sorte, disse ele, a tua também teve sorte, Ciranda. Sorri da analogia desproporcionada. Do outro lado da mesa, ajuntou o arquitecto: pelo menos há uma soror no teu mosteiro! Imagino as solicitações na grade...

Dois dias, inter pares.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Katie Melua

If the lights go out

They say the world must end somehow,
They say the end’s not far from now;
I think they’re wrong,
Don’t worry your life away,
Start living for today,
Don’t think about tomorrow.

And if the lights go out on all of us,
In just a year or two.
And if the sky falls down like pouring rain,
Then I’ll be here with you.
I’ll go down with you.
(...)

Para o João.

terça-feira, 6 de maio de 2008

A minha Photo é smart e express!!!

Tenho a minha impressora há mais de dez meses mas continua a proporcionar-me as melhores surpresas. Por exemplo, há dois meses descobri que tinha uma peça que se desencaixava para acolher as folhas impressas e hoje vi que essa peça tinha uma pequena pala que se levantava e que prendia as folhas no sítio.

Fiquei feliz. Já não tenho de me debruçar para apanhar as folhas espalhadas pelo chão, nem tirar as rodas da cadeira de cima delas. A bem dizer, a minha vida neste escritório era um martírio. Agora está um céu: a impressora a fazer o seu trabalho de forma ordeira e eu sossegada, a continuar o trabalho no computador, sem se ouvirem berros e exclamações, tipo filha da mãe, precisavas de mandar as folhas com tanta força cá para fora... imprime mais devagar, se faz favor... isto, na folha, é a marca de quê???

É uma paz.

Um rebuçado para quem souber do que estou a falar!

Um amigo meu enviou-me. Ainda tenho de lhe perguntar como lhe chegou isto às mãos. Mas o spot está lindo. Repito o título do post: um rebuçado para quem souber do que estou a falar!!!

Vejam a pista em:
http://br.youtube.com/watch?v=231sb6yVANI

Sadness

Fala-me da tristeza.

Quando a sala fica vazia e o palco se recolhe à solidão, desaparecida a turbulência do corpo e da voz, é tristeza que eu quero que murmures na minha pele.

Espera um pouco, meu amor. Eu já não demoro no sorriso e no beijo. Agora preciso de estar quieta, silenciosa, fechada, deixando que o presente se afaste devagarinho das memórias em que queria diluir-se.

domingo, 4 de maio de 2008

Atenção

Depois de passar no Pensar Viseu & Perspectivas, fui directamente ao Público: "Quem ajudava já precisa de ajuda".
É importante ficar atenta.
N'A Origem das Espécies, FJV chama a atenção para um artigo "fundamental" de José Pacheco Pereira, no Público.

Eu não estou desempregada, mas sei que posso vir a estar e sei de muita gente que está. E também sei de muitos outros que não têm a mínima noção da realidade que se está a viver. Mesmo. A começar pelos políticos. Mas não só.

Sei muito bem de que fala José Pacheco Pereira. Já agora, perguntem ao governo para quê tanta estrada, auto-estrada e pqp, com portagens e tudo, se qualquer dia, com o preço dos combustíveis a chegar a valores impensáveis, ninguém anda de carro. Razão têm a a TVI e a SIC... as novelas, sejam da Globo sejam de produção nacional, enquadram-se muito bem neste contexto de crise.
E... por hoje chega.

Pasárgada aos 5 anos

Ó filho, já não posso contigo ao colo. Estás cada vez mais crescido.

Pois, já cresci muito. Sabes, mamã, nós nascemos, crescemos e morremos.
Eu gostava de viver num país onde não morresse.


E eu gostava de viver num país onde pudéssemos morrer de vez em quando, meu querido.

Dia da Mãe



Tirou do açafate uma rosa e deu-ma com um sorriso. Aceitei a flor e abracei-a.
As intenções, a minha e a dela, eram boas.

sábado, 3 de maio de 2008

Mundo Perfeito

Acompanho vários blogues, mas uns mais do que outros. É o caso d'O Mundo Perfeito, que tem textos como este.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Maio


Maio
Foi sempre o tempo de todas as promessas.